O Mundo de Hoje à Luz das Histórias de Ontem
- ESPAÇO MATÃO COMUNICAÇÕES
- 18 de dez. de 2023
- 4 min de leitura
Já diz o velho ditado que aqueles que não conhecem a história estão fadados a repeti-la. Por isso aprendi a encontrar sentido para essa vida caótica em histórias antigas. Neste fim de ano, permitam-me compartilhar duas delas com vocês.
A luta pela liberdade
A primeira história acontece no século II antes de Cristo. Enquanto o império grego crescia em influência e domínio por grande parte do mundo, um povo pequeno e teimoso ousou pleitear pela própria liberdade. O povo judeu peitou a cultura conquistadora, que em nome de uma suposta iluminação filosófica buscava aniquilar a liberdade religiosa. Antiocus Epifânio, rei do império Selêucida, violentou a alma do povo Judeu, sacrificou um porco no altar do templo em Jerusalém, e foi particularmente cruel em sua busca por dessecrar aquilo que os Judeus consideravam sagrado. Os judeus tiveram que lutar pelo simples direito de existir, de cultuar, de se expressar livremente. Nessa história, o pequeno prevalece em sua coragem - e toda a força do império grego não é suficiente para abafar a insistência judaica pela vida. A vitória da luz da liberdade sobre as trevas da perseguição religiosa tem sido celebrada pelos últimos 22 séculos na festa de Hanukkah, o festival das luzes.

(Na imagem: uma Hanukiah - um candelabro de 9 velas que é acendido pelo povo judeu durante as celebrações de Hannukah)
Ver sem enxergar
A segunda história ocorre cerca de 200 anos depois, quando o judeu mais famoso do mundo - Jesus - vai a Jerusalém para celebrar essa mesma festa - Hannukah. Na história relatada no evangelho de João, Jesus é interrogado por líderes políticos e religiosos, que não sabiam ao certo definir se Ele era - em termos simples - do bem, ou do mal. A interação é fascinante. Jesus responde às acusações contra ele dizendo, basicamente: “Vocês rejeitam e distorcem tudo que eu digo. Por mais que eu fale do que é belo, vocês encontram feiúra nas minhas palavras. Se o que eu digo não basta, então olhem o que eu faço! Minhas obras. Minhas atitudes. Como eu escolho me portar perante o mundo. Mas vocês duvidam disso também!” A conclusão que Ele tira é que o colocam em dúvida não por que não estão escutando suas palavras, ou vendo suas atitudes - mas por que mesmo escutando e vendo, escolhem não ouvir e enxergar.
Evoluímos, mas não tanto
Duas histórias separadas por quase 200 anos uma da outra, e a 2 mil anos de distância de nós. Duas histórias que aconteceram no mesmo lugar que hoje, em 2023, é palco de outra guerra pela liberdade. Onde além de mísseis e explosões, opiniões também são arma.
No dia 07 de Outubro de 2023, Israel foi brutalmente invadida por um grupo terrorista radicalizado islâmico. As barbaridades cometidas contra o povo de Israel não cabem em palavras - e não seriam compatíveis com uma edição comemorativa de fim de ano deste periódico. A alma do povo de Israel foi violentada. Sacrificaram um porco no altar da vida que nos é sagrada. E eu entendo o impulso imediato de rejeitar a comparação com a primeira história que lhes contei acima - por que neste caso Israel é quem parece como o grande império. Mas essa percepção é equivocada. Sim, a nação de Israel é sábia, e economicamente potente, e seu exército é uma das forças militares mais capazes do mundo inteiro. Mas somos como uma gota em um oceano se você tem a perspectiva correta. Há cerca de 15 milhões de Judeus no mundo todo. Menos de 10 milhões de habitantes em Israel. O país é menor que o Sergipe. Nossos inimigos não são os palestinos, ou os árabes no geral, e muito menos os muçulmanos. Nosso inimigo é a cultura de extremismo religioso e ódio, que encontra satisfação em se explodir e abraçar a morte, ao invés de valorizar a vida. É a velha história que trata o povo judeu como culpado pelas malécias do mundo. É o anti-semitismo, expert em indignação seletiva - que se cala quando milhões de muçulmanos são assassinados por muçulmanos, mas correm pras ruas quando Israel precisa se defender em uma guerra trágica que não começou. Que se calam diante do estupro - por que as vítimas sao judias, sao israelenses - enquanto se gabam de lutar pelos direitos das mulheres. E o volume dessa força esdrúxula e intangível se agiganta feito Golias perante o povo de Israel.

(Na imagem: Kfir Bibas, bebê de 9 meses que foi sequestrado pelo Hamas no dia 07 de outubro junto com sua mãe e irmã de 4 anos - eles estão em cativeiro há mais de 60 dias).
A dissonância cognitiva aqui é muito similar com a experiência de Jesus naquela festa de Hanukkah. Parece que independente de quaisquer palavras ou atitudes, a opinião de uma multidão de gente já está formada - e já decidiram crucificar a Israel no madeiro de seu senso deturpado e egoísta de justiça. Ainda que Israel tome todas as medidas cabíveis a qualquer exército em tempos de guerra, ainda que a manipulação midiática por parte do Hamas seja clara, ainda que ofereçamos provas incontestáveis da necessidade de proteger nossa população, ainda que o próprio Hamas prometa em toda oportunidade que tem que continuará fazendo o que fez dia 07 de outubro até que seja bem sucedido em seu alvo de exterminar Israel do mapa e o povo judeu da terra - ainda assim, nada parece suficiente pra convencer quem já decidiu que vendo e escutando, não quer enxergar e ouvir.
Luz e esperança
No tumulto desses dias encontro conforto naquelas histórias antigas. Por que, por fim, o povo pequeno e teimoso obteve a vitória contra quem se travestiu de iluminado só para destilar o ódio e a destruição com mais eficácia. Por fim, a mensagem daquele rabino de Nazaré chamado Jesus percorreu o mundo inteiro, e não houve um império ou político sequer que pôde detê-la.
Minha oração neste fim de ano, enquanto Cristãos decoram suas árvores de natal com luzes, e judeus acendem as velas de Hanukkah - que a Luz alcance muito além de nossas salas em casa, e ilumine nosso planeta inteiro com a paz que tanto precisamos.
Sobre o autor:
Rodrigo Cardoso, é Israelense e Brasileiro, casado e pai de dois filhos. Ele vive com a família em Israel há mais de 15 anos. Guia de turismo especializado no desenvolvimento das religiões na Terra Santa.






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